Artigo que escrevi para o curso de pós-graduação em Terapia de Casais e da Família sobre o tema mudanças na família.
MUDANÇAS NA FAMÍLIA
Quando
olhamos ao redor podemos observar atentamente as mudanças estruturais de nossa
sociedade, a começar pela família. É só olharmos a 30 anos atrás e veremos que
muita coisa mudou na família, a começar na sua própria configuração original. A
família tradicional como assim é chamada é formada de Pai, Mãe e filhos, sua
base se dá através do papel que eles desempenham, cada um tem seu papel e deve
executá-lo conforme o que está estabelecido.
Nesta
configuração podemos colocar o Homem ou Pai como o chefe da família, é um
mediador da família com o meio externo, exerce a figura do provedor da casa. Já
a mulher ou mãe, é a responsável por manter a unidade do grupo e zela para que
tudo esteja no seu devido lugar, e os filhos deve obedecer à determinação
deles.
Analisando
esta configuração já podemos observar que nos últimos 30 anos isto já mudou,
podemos e devemos entender alguns fatores que ajudam a refletir sobre esta
mudança, não podemos deixar de lado as próprias mudanças de nossa sociedade que
nos remetem a entender ou enxergar aspectos fundamentais que norteiam a
sociedade e sua própria cosmovisão.
Vivendo sob
a influência da sociedade pós-moderna a família é influenciada pelos valores
relativistas desta sociedade, entendendo alguns aspectos como a morte do
futuro, o prazer precisa se imediato, o desejo vire uma necessidade e o ter, ou
melhor, parecer ter é a chave do sucesso.
Com essa
nova visão da vida temos então uma nova dinâmica pessoal e familiar que acaba
atingindo diretamente nossos relacionamentos e perspectivas de vida, gerando
assim famílias que vivem em um constante desafio, pois essa mudança de
paradigma trás novos conceitos e novas maneiras de se encarar a dinâmica
familiar.
Por isso ao
olharmos a sociedade de hoje não podemos e nem devemos interpretá-la de maneira
simplista, precisamos sim olhar ao redor, através deste prisma, é evidente que
isso nos remete a uma transição, porém se faz buscar um olhar para essa
realidade de maneira correta, e para isso é necessário que olhemos para essa
nova dinâmica.
Portanto, entendo
que neste primeiro momento o grande desafio da sociedade é entender o que está
acontecendo, isso é um desafio, pois muitas vezes interpretamos a realidade á
luz da nossa realidade familiar que na verdade está ligada ainda a um modelo
que ainda existe, porém isso tem mudado e cada vez mais, e por isso encontramos
famílias cada dia com uma configuração que não estávamos acostumados.
Para que
comecemos a entender o que isso representa é necessário entender algumas
mudanças sociais que são chave para nosso entendimento. Com o advento da pílula
anticoncepcional tivemos então a separação da sexualidade da reprodução, ou
seja, o sexo pode e deve ser feito por prazer e não apenas para a reprodução.
A mulher
conquista o mercado de trabalho, e a partir daí temos uma guindada nos papéis
familiares, pode-se observar que a dinâmica muda, a mulher não fica em casa
para fazer os deveres domésticos, mais, passa a ajudar no orçamento.
Essa configuração
trás algumas alterações na dinâmica das famílias, a própria divisão de poder
financeiro, tarefas domésticas, educação de filhos, temos ai alguns paradigmas
quebrados, a sociedade passou a se adaptar a uma nova realidade de papeis, de
mercado e de relacionamentos.
Em relação
aos relacionamentos podemos entender que o número de divórcio aumento pelo fato
de que as mulheres tendo independência financeira passam a ter a “coragem” de
se divorciar, pois não dependiam do homem para seu sustento e sustento da casa,
passaram a enxergar o mundo de maneira diferente e com isso passaram a ter um
olhar mais crítico.
Essa nova
relação e inovação de papeis em contrapartida, trás para mulher uma questão que
é crucial, a criação de filhos, se no inicio desta nova realidade as crianças
ficavam com as avós ou parentes, hoje elas são criadas por babas, creches ou
escolas. Isso muitas vezes trás a mulher um peso de culpa já que não passam
muito tempo próximo dos filhos.
Esta
configuração remete a muitas famílias que trazem este peso de culpa a ser
permissiva e tratar os filhos como “Reis”, pois a filosofia é esta, se não
passo tempo com meu filho tenho que compensa-lo de alguma forma. Vivemos hoje
numa sociedade consumista, como já vimos às pessoas querem aparentar ter, e
muito disso já vem sendo colocado na mente das crianças, já que os pais tentam
suprir todas as necessidades dos filhos.
Nossa
sociedade atual tem tido uma tendência de mercado de terceirização, ou seja, eu
passo o serviço para os outros, via de regra é isso que tem acontecido em nossa
sociedade, os pais deixam a educação por conta da escola, gerando assim uma
cobrança em cima da escola, ou seja, eu pago e meu filho deve ter uma boa
educação.
Diante
desta situação podemos entender que ao invés de se buscar uma parceria entre
escola e pais os pais tem delegado isso a escola, ou seja, o trabalho de
colocar regras, limites, responsabilidades é delegado à escola e assim sendo
cabe aos pais somente a parte de passear, dar presentes, pois a questão da
culpa pela ausência deve ser suprida.
Além do
fator dos filhos serem o centro da família temos que levar em consideração o
divórcio e o recasamento, com isso se perde a referência rígida dos papéis no
casamento, por exemplo, um homem que se separa, deve ter de rever a sua
perspectiva de pai de maneira diferente já que ou não está mais no dia a dia dos
filhos ou deve educa-lo não mais contando com a presença da mãe no dia a dia.
Podemos
ainda pensar que dependendo da forma que ocorreu a separação às vezes o diálogo
entre os pais é difícil, como muitas vezes acontece o recasamento de um ou de
ambos que trazem consigo uma nova pessoa e em alguns casos de outros filhos,
onde do dia para a noite se passa a conviver com novos “irmãos”.
Essa nova
dinâmica passa a interferir na dinâmica e nos papeis a serem desenvolvidos
pelos pais e filhos, é até por isso que a rede familiar de parentes acaba
diminuindo, dificilmente hoje em dia vemos famílias inteiras se reunido para o
almoço de domingo, até porque a famosa foto familiar acaba mudando de tempos em tempos. As famílias
acabam se reunido de maneira nuclear, pai, mãe e filhos, aquele negócio de tio,
tia, primos e primas, só se encontram em casamento e estes cada vez mais raros
e funerais.
Acredito que
nossa sociedade viva um tempo de relacionamentos banalizados, é só olharmos
para os estágios que antecedem o casamento, antigamente era namorar (rápido),
noivado e casamento, hoje nós temos o ficar, namorar, morar junto e talvez se
casar.
Vejo que
essa isso demonstra a falta de compromisso em nossos relacionamentos, cada vez
mais as pessoas vão tornando seus relacionamentos frágeis e sem vínculos
duradouros, gerando assim uma sociedade onde os papeis acabam se fragilizando
cada vez mais o que na verdade acaba gerando confusão.
Dentre esta
nova configuração podemos colocar o seguinte , a família tradicional sobre a
qual já fizemos nossa colocação, a família reconstituída, aquelas que os pais
trazem os filhos do primeiro casamento, onde podemos de fato verificar a
fragilidade dos papeis, pois ela sai do básico da família tradicional e parte
para um novo tipo de relacionamento como os padastro/madrastas e “irmãos” onde
não se sabe de fato como deve ser o relacionamento, o como lhe dar como os
conflitos e seus desdobramentos no relacionamento conjugal e o relacionamento
com os filhos e com os filhos do outro, sabe-se que a acomodação destas coisas
pode levar cerca de nove anos.
Outro
exemplo são as famílias monoparentais, onde apenas cuida do filho, ou por ser
solteiro, ou por uma opção da chamada “produção independente”, ou até no caso
da viuvez. Neste caso também temos o grande desafio de cuidado com os filhos e a
dificuldade de lhe dar com o filho e sua vida pessoal, neste caso há um grande altruísmo
em relação aos filhos, porém na idade adulta existe uma cobrança muito grande
em relação ao que os pais sozinhos fizeram pelos filhos, já que carregaram
sozinhos a criação, e isto lhes dá um certo álibi para cobrar os filhos pelo
que fizeram por eles.
Os filhos
principalmente na idade adulta tem muita dificuldade em lhe dar com a cobrança,
já que sempre são lembrados que foram criados com sacrifício, que o pai ou a
mãe tiveram que abrir mão de coisas
pessoais para poder suprir necessidades, causando às vezes até certo tipo de
problema quando os filhos casam e com isso criam uma nova família, gerando uma
disputa entre o pai ou mãe e o cônjuge.
Outro
exemplo são as uniões consensuais onde o casal vive cada um na sua casa com
seus filhos, não há formalidade, casamento formal, e cada um administra a sua
própria casa, isto também gera uma visão de relacionamento muito superficial,
pois pelo fato de cada um viver em sua casa pode se criar um ambiente sem
compromisso, sem muito envolvimento, ou seja, pode se tornar um relacionamento
frágil ou instável, onde se pode priorizar os filhos em detrimento ao
relacionamento com o outro.
Temos
também os casais sem filhos por opção, tendem a levar o relacionamento sem a
necessidade ou expectativa de ter filhos, isso tem se tornado comum por fatores
econômicos pelo fato de se pensar na despesa ou no tempo que os filhos consomem,
é importante ressaltar que somente quando isso se dá por consentimento mútuo é
que funciona quando isso se dá de forma unilateral tende a criar frustração.
Hoje também
tem sido muito comum às famílias unipessoais, elas via de regra são pessoas que
desejam viver uma vida só, inclusive as empresas estão se preocupando em satisfazer
este mercado, os próprios
empreendimentos imobiliários tem olhado para este público.
Temos
também a família por associação que se dá pela necessidade ou proximidade,
podemos detectar em grupos que vivem longe de casa como os imigrantes e também
em grupos religiosos como as Igrejas que indivíduos partilham da mesma fé e por
isso acabam pela necessidade e por valores em comum vivendo como uma família.
Portanto estes
exemplos nos mostram a realidade fundamental da família em nossa sociedade, por
isso quem trabalha com família deve estar atendo a estas mudanças não podendo
deixar de olhar as mudanças de nossa sociedade como um todo. Por isso aos
profissionais cabe um vasto campo de trabalho, porém e em contrapartida é
necessário estudarmos e nos avaliarmos diante de todos estes desafios.
Por isso
cabe a cada um de nós a busca pelo saber e entender essa realidade que hoje se
vive, não podemos deixar de lado esta mudança, é preciso olhar para ela e
procurar buscar a reflexão.
K se foda a mudança!
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